Não existe tipificação no Código Penal que traz o crime passional em si. O termo trata-se mais de uma expressão e não de um crime propriamente dito. 

Segundo o dicionário, o termo passional está ligado ao sentimento de paixão ou àquele amor ardente. São os crimes violentos contra uma pessoa pela qual se tem algum tipo de sentimento amoroso. Crimes estes, em sua maioria, cometidos por homens contra as mulheres.

O crime passional é também conhecido como crime movido por paixão.

O  crime é cometido, normalmente, após um descontrole emocional por parte do agente, que acaba decaindo sobre a vítima. Seja por uma crise de ciúmes, não aceitação do fim do relacionamento, sensação de posse sobre a pessoa, etc. 

Neste artigo, você entenderá o conceito do crime, estudará casos concretos, entenderá a diferença entre o crime e o feminicídio e muito mais! 

O que é um crime passional?

Um crime passional é um crime violento cujo motivo se dá pela paixão, ciúmes, sentimento de posse, etc. 

Apesar de ser um crime em que tanto a figura ativa quanto a passiva podem configurar qualquer pessoa, geralmente são homens que cometem estes crimes contra as mulheres. 

A pessoa que comete o crime passional pode apresentar alguns comportamentos abusivos antes da configuração do delito. Como por exemplo, aquele ciúme em excesso em que monitora a vítima o tempo inteiro.

No entanto, o crime é passional quando se dá logo após um descontrole causado por uma emoção intensa do agente criminoso. Ele não pode ser premeditado, nem tampouco ocorrer por discriminação ou menosprezo com a condição do gênero da mulher, posto que assim, estaríamos diante do feminicídio. 

Nesse sentido, os crimes geralmente ocorrem onde há um vínculo amoroso entre o agente e a vítima. Todavia, podem ser cometidos ainda que não haja um vínculo. São aqueles casos de amores platônicos ou não correspondidos.

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Qual a diferença entre crime passional e feminicídio?

Enquanto o feminicídio ocorre pela condição do gênero feminino, ou seja, há na conduta um certo menosprezo ou discriminação contra o sexo feminino. No crime passional, o que motiva a violência é o sentimento amoroso do agente. 

Crimes cometidos contra mulheres em sua maioria são configurados como feminicídio, principalmente quando tratam-se de delitos no contexto de violência doméstica ou familiar. Entende-se que o crime de feminicídio é um tipo de crime de ódio contra a mulher.

Na verdade, muitos afirmam que o crime passional nem existe mais. Como já dito, a maioria dos crimes contra a vida das mulheres têm sido enquadrados no tipo penal do feminicídio. 

Por outro lado, alguns juristas acham importante cada crime no seu devido lugar. E que sejam imputados após uma análise cuidadosa.

Pois são casos diferentes e enquadrar qualquer crime contra a vida da mulher na qualificadora do feminicídio, pode aumentar as estatísticas de forma errônea, atrapalhando a devida aplicação da norma penal, bem como da democracia.

Isso porque, alguns crimes decorrem de um único descontrole do agente. Por exemplo, um casal que sempre viveu em harmonia, em um único dia, brigam de forma mais severa e após uma violenta emoção seguida de uma provocação, o agente acaba a agredindo fisicamente até a morte.

O criminoso passional e a cultura do machismo 

Se olharmos para trás, a história corrobora para que crimes dessa natureza aconteçam até hoje.

Em tempos antigos, a mulher não respondia por si. Na Roma Antiga, a mulher não era considerada cidadã plena, mas seu marido tomava todas as decisões por ela.

No Brasil, na idade moderna, existia a ordem de agressão às mulheres infiéis, podendo até mesmo condená-las à morte. 

Com a chegada da Revolução Francesa, algumas coisas mudaram. À mulher, finalmente foi reservado o direito à vida. Chegando perto do fim, os tempos de agressões físicas e morais sem punição. 

Essa conquista chegou ao Brasil apenas em 1830. O homem que praticava crimes contra a vida da mulher, respondia pelo homicídio. No entanto, muita coisa ainda precisava mudar. 

Durante muito tempo, perdurou nas teses de defesa a chamada “legítima defesa da honra”. Em que o marido matava sua esposa pois ela tinha “manchado sua honra” e esta seria a única forma de ter a sua honra preservada novamente. 

Na verdade, em uma sociedade machista, este comportamento era até mesmo esperado pelas pessoas. Houve um tempo em que quando ocorria algum episódio de traição por parte da mulher, o próprio Estado itervinha, pedindo sua condenação, inclusive à pena de morte algumas vezes.

Em 1890, o primeiro Código de Processo Criminal trouxe um dispositivo que abolia a pena do indivíduo que cometia o delito “sob um estado de total perturbação dos sentidos e da inteligência”.

Ou seja, sempre existiram ferramentas que apaziguavam os crimes desta natureza. Antes, o esposo podia agredir, torturar, matar a esposa que não lhe obedecia, que era infiel, etc. Depois, ainda que a conduta fosse criminalizada, existiam formas que justificassem os atos bárbaros. 

Apenas em 1940, com o advento do Código Penal, o dispositivo deixou de existir. E a norma penal, em seu artigo 28, I, fez questão de trazer que crimes cometidos por paixão ou emoção não excluem a imputabilidade penal.

No entanto, existe hoje uma causa de diminuição de pena prevista para o crime de homicídio. 

Trata-se do homicídio privilegiado. Em que pese, a pessoa que comete o delito por um relevante valor social ou moral ou ainda sob uma violenta emoção e logo em seguida de uma injusta provocação da vítima, poderá ter sua pena diminuída de um sexto a um terço.

O crime passional é enquadrado em que tipo penal?

É importante que se saiba que o termo passional trata- se de uma expressão. Ela se refere àquele crime violento praticado logo após um descontrole emocional do agente, motivado pela paixão.

Não existe o termo “crime passional” descrito no Código Penal. 

Nem por isso o agente deixará de responder pelo delito. Pois não há excludente de ilicitude e nem tampouco de sua culpabilidade para este tipo de delito. 

Então, quando se pratica algum crime neste contexto, ele se enquadra nos crimes contra a vida. Se há o resultado morte, teremos o crime de homicídio privilegiado.

O homicídio privilegiado é uma causa de diminuição de pena para quem pratica o homicídio doloso. 

O homicídio privilegiado é aquele praticado por um relevante valor moral ou social ou sob o domínio de uma violenta emoção, logo após uma injusta provocação da vítima. 

É o marido que ao chegar em casa se depara com sua esposa o traindo, por exemplo.

Nesse sentido, o criminoso precisa praticar o crime logo após o fato, no momento em que está sob a violenta emoção. Pois não há o que se falar em crime passional ou homicídio privilegiado em um crime premeditado. 

Um crime premeditado neste contexto, em que há vínculo amoroso, provavelmente irá configurar como feminicídio. Cujo a pena é de 12 a 30 anos de reclusão, pelo emprego da qualificadora.

O crime de feminicídio pode ser considerado crime passional?

O crime de feminicídio não é um crime passional.  Ou há o emprego da qualificadora do feminicídio ou o crime é passional.

O crime de feminicídio é um crime de ódio contra a mulher. É o homem que ao se deparar com uma mulher de saia curta na rua, resolve espancá-la porque acredita que uma mulher não deva andar de tal forma. 

É um crime em que há discriminação ou menosprezo pelo gênero feminino.

Ou aquele crime praticado no contexto de violência doméstica ou familiar, como um marido que não aceita que sua mulher trabalhe, estude, tenha contato com outras pessoas. É a mulher que morre por ser mulher. Trata-se de um crime cujo motivo se dá pelo ódio.

É o contrário do crime passional. Apesar disso, existe o contexto do machismo por trás de ambos os crimes. Posto que em um existe a sensação de superioridade sobre a mulher, com o menosprezo pelo gênero e no outro há aquele sentimento de posse sobre a vítima. 

Para o Direito Penal, os crimes não se confundem. Isso porque, o agente que pega sua esposa no flagra pode nunca ter sido, antes, abusivo com a mesma. Tendo o crime sido praticado em um contexto único sob o domínio de uma violenta emoção. 

Agora, se o Juiz entende que não há o que se falar em crime passional, muito provavelmente o crime praticado no contexto de violência doméstica ou familiar será enquadrado na qualificadora do feminicídio. 

Apesar de ser possível um crime ser qualificado e privilegiado ao mesmo tempo, no caso do feminicídio, o agente não faz jus a causa de diminuição de pena. O crime será tão somente qualificado.

Como é a atuação do Advogado em um crime passional?

Como já citado, não existe crime passional no Código Penal. 

O termo refere-se àquele crime praticado no contexto de forte emoção e movido pela paixão. 

Quando essas características estão presentes no crime, o que pode acontecer é enquadrá-lo no tipo penal do homicídio privilegiado. Cujo a pena do agente será menor que a prevista para o homicídio simples.

Caso o cliente se considere inocente, o Advogado pode buscar provar sua inocência com fatos, relatos de testemunhas, etc. 

Tendo indícios suficientes de materialidade e autoria do delito, talvez seja a hora do Advogado montar sua estratégia de defesa com a tese do homicídio privilegiado. 

Ou seja, provando que seu cliente cometeu um crime cuja motivação se deu pela violenta emoção que sentiu no momento do fato. E logo após uma injusta provocação da vítima. Como uma traição, por exemplo.

O crime contra a vida da mulher no contexto de violência doméstica em que não é possível o emprego da causa de diminuição de pena, muito provavelmente irá configurar como feminicídio. Nesse caso, a situação complica um pouco mais para o réu, posto que a pena é de 12 a 30 anos de reclusão.

É importante ressaltar que ainda que não se caracterize a qualificadora do feminicídio, nada impede que sejam observadas outras qualificadoras.

Como àquelas relacionadas à execução do delito. Por exemplo, quando há emprego de tortura, fogo, explosivo, etc. 

Nesse caso, a pena do réu também será de 12 a 30 anos, porém, admite-se a figura do homicídio qualificado-privilegiado, ou seja, ele pode ter sua pena diminuída de um sexto a um terço.

Por fim, um Advogado também busca a garantia de todos os direitos constitucionais no processo criminal, como o direito à ampla defesa e contraditório, presunção de inocência, a dignidade da pessoa humana, etc.

O crime passional pode deixar de existir?

Muitos noticiários têm deixado de noticiar crimes com a expressão passional. 

Alguns juristas acreditam que este termo deve cair em desuso. Alguns jornalistas compartilham da mesma opinião. 

Segundo essa linha de pensamento, acredita-se que o termo é mais uma forma de manter o machismo na sociedade, remetendo a culpa dos crimes às mulheres. 

Como citado neste artigo, a paixão ou emoção não excluem a imputabilidade penal. Desta feita, crimes contra a vida da mulher devem ser tratados como feminicídio. Com exceção dos crimes que não aconteceram dentro do contexto de violência doméstica e também naqueles em que não houve a discriminação pelo gênero. 

Como por exemplo, crimes cujo motivo foi uma briga de trânsito, briga em um evento, etc. 

Apesar disso, advogados utilizam bastante o termo em teses de defesa. Criminosos passionais podem se beneficiar por causa da diminuição da pena do homicídio privilegiado. A causa está na lei e portanto, não há nada que impeça a defesa de requerer. 

De toda sorte, o termo pode sim entrar em desuso daqui há alguns anos. Crimes contra a mulher podem configurar feminicídio, quando presente os pressupostos ou, podem se tratar de um crime comum doloso contra a vida, no caso, o homicídio. Não havendo, portanto, a necessidade da permanência do termo passional. 

Conclusão

Chegamos ao final do nosso artigo sobre crime passional. 

Agora, você já sabe o conceito do crime e todos os aspectos que o regem. 

Só para recapitularmos, o crime será passional ou será qualificado pelo emprego do feminicídio. Não há o que se falar em crime privilegiado-qualificado quando há o feminicídio. 

O crime de feminicídio é caracterizado como um crime de ódio contra as mulheres. Ao passo que o crime passional é aquele crime movido pela paixão, pelo sentimento. 

Apesar das críticas e da falta de consenso entre os juristas, o crime passional continua sendo utilizado em teses de defesa. 

E quando configurado, o agente pode responder a título de homicídio privilegiado, em que há uma causa de diminuição em sua pena, pois entende-se que ele agiu dominado por uma violenta emoção, logo após uma injusta provocação. 

Não deixe de ler nosso texto sobre feminicídio para melhor entendimento do tema. Também temos um texto que fala especificamente do homicídio privilegiado. E se você quiser entender tudo sobre a pena do delito e como funciona a progressão de regime, não deixe de conferir nosso texto sobre reclusão.

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Luana Selva, é advogada inscrita na OAB PE 58.491. Graduada em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco, pós-graduanda em Penal, Processo Penal e Segurança Pública pelo Instituto Imadec.